Não é necessário comentar que 2020 foi um ano desafiador. Por isso, indicamos três autores austríacos que, apesar de terem suas obras publicadas há algum tempo, podem nos ajudar a pensar os tempos de hoje. 

O mundo insone, Stefan Zweig

(Zweig, Stefan. O mundo insone e outros ensaios. Trad. Kristina Michahelles. Rio de Janeiro: Zahar, 2013). 

Nesta coletânea de ensaios, Stefan Zweig (1881-1942) passa por muitos temas: da questão judaica à arte, de Montaigne a Freud, passando por Hesse e Roth. Mas é justamente no ensaio que dá título ao livro, O mundo insone, que lemos o sentimento de Zweig perante às tragédias do mundo – nesse caso, o começo da Primeira Guerra Mundial. 

“Há menos sono no mundo agora, as noites são mais longas e mais longos os dias. Em cada país da infinita Europa, em cada cidade, cada ruela, cada casa, cada aposento, a respiração tranquila do sono tornou-se curta e febril, e o tempo ardente abrasa as noites e confunde os sentidos, tal qual uma noite de verão abafada e sufocante”, relata Zweig.

O conflito cresce e o sono desaparece. Com a experiência de alguém que passou por uma quantidade considerável de conflitos para uma vida, Zweig narra as mudanças da sua idealizada Viena enquanto vê seus ideais ruírem. O ensaio descreve um período de ansiedade e incertezas crescentes e se tornando cada vez mais comuns na vida de todos.

O tempo adiado e outros poemas, Ingeborg Bachmann

(Bachmann, Ingeborg. O tempo adiado e outros poemas. Trad. Claudia Cavalcanti. São Paulo: Todavia, 2020). 

Ingeborg Bachmann (1926-1973) fez parte da geração de escritores que produziram logo depois da Segunda Guerra Mundial, e pensaram uma linguagem e uma literatura capazes de descrever e lidar com os acontecimentos e sentimentos dos anos anteriores. 

Nesse contexto, Bachmann dedica muitos dos seus poemas a um espaço interno, dando atenção ao sentimento do indivíduo diante do mundo, trazendo poesia e lirismo a tempos de pouca esperança. 

Mas para onde iremos
don’t worry, don’t worry
quando escurecer e esfriar

Praça dos heróis, Thomas Bernhard

(Bernhard, Thomas. Praça dos Heróis. Trad. Christine Röhrig. São Paulo: Temporal, 2020). 

Thomas Bernhard (1931-1989) é uma das grandes vozes críticas de seu tempo. Nessa peça, que se passa em um 1989 que lembra muito 1938, ano da anexação da Áustria pela Alemanha de Hitler, o autor reflete sobre um passado que não se encerra e não se digere, com ideias voltando ciclicamente para o espaço público e encontrando eco em uma nova geração. 

Eu não posso deixar o apartamento
só porque você ouve essa gritaria da Praça dos Heróis
ele sempre repetia
significaria que pela segunda vez esse Hitler
me expulsou do meu apartamento

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